Depois de um dia de massacre no Ibovespa, com queda de quase 4%, seria preciso quase um milagre para animar o mercado. E veio o milagre, com nome e sobrenome: Michel Temer. O ex-presidente conseguiu o que parecia impossível: dialogou com Bolsonaro e o fez assumir uma postura conciliatória entre os poderes.

A conversa começou na noite de ontem. Hoje pela manhã, Bolsonaro mandou um avião buscar Temer. O ex-presidente elaborou uma nota oficial, e o atual aprovou.

O texto, divulgado às 16h25 com a assinatura de Bolsonaro, é bem direto, em tópicos. Os mais importantes:

  • "Nunca tive nenhuma intenção de agredir quaisquer dos Poderes. A harmonia entre eles não é vontade minha, mas determinação constitucional que todos, sem exceção, devem respeitar.
  • "Minhas palavras, por vezes contundentes, decorreram do calor do momento e dos embates que sempre visaram o bem comum.
  • "Reitero meu respeito pelas instituições da República, forças motoras que ajudam a governar o país."

De fato. Só faltou mesóclise para não restar dúvida sobre quem foi o autor real da nota.

Era a medida que o mercado precisava para apaziguar os ânimos após os protestos com viés golpista do 7 de setembro, que derrubaram o Ibov em quase 4% ontem. Para piorar, os desdobramentos dele levaram os caminhoneiros a bloquear parcialmente estradas em pelo menos 16 estados no país, o que amargou ainda mais os mercados com a ameaça de desabastecimento e mais pressão sob a inflação. (Alguns pontos de bloqueio ainda permanecem, inclusive.)

Tanto que o Ibovespa passou quase o dia todo no vermelho. A virada mesmo veio na última meia hora de pregão, e foi abrupta: o índice, que vinha caindo mais de 0,7%, repentinamente subiu e fechou em, 1,72% – uma variação de quase três mil pontos em questão de minutos. Dos 91 papéis do índice, só três fecharam no vermelho (veja abaixo).

A nota, diga-se, não é exatamente um manifesto pacifista. Ela diz que Bolsonaro pretende seguir a briga com Moraes, mas "dentro da Constituição":

  • "Existem naturais divergências em algumas decisões do Ministro Alexandre de Moraes. (...). Essas questões devem ser resolvidas por medidas judiciais que serão tomadas de forma a assegurar a observância dos direitos e garantias fundamentais previsto no Art 5º da Constituição Federal."

Interprete como achar melhor. Todas as análises políticas dos jornais da noite dirão que Bolsonaro sentiu a água bater, e chamou a ajuda dos universitários para evitar um impeachment iminente. E estarão certas.

O fato é que o mercado gostou. E isso num dia que começou nas trevas, quando o IBGE divulgou a obesa inflação de agosto.

Inflação

O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) registrado pelo IBGE em agosto foi de 0,87%. É uma leve desaceleração em relação a julho (quando o índice registrou 0,96%), mas acima da mediana das expectativas do mercado (0,70%) – mais até do que i teto das expectativas (0,85%).

Também é o maior número para um mês de agosto desde 2000, segundo o IBGE. No acumulado de 12 meses, a inflação quase bateu os 10%.

A grande protagonista da alta é a gasolina, com uma alta de 2,80% em agosto e 31% no ano. Mas não só ela: oito dos nove grupos de produtos e serviços pesquisados tiveram alta no mês; com destaque para, além do transporte, o setor de alimentação e bebidas – alta de 1,39%.

A reação do mercado ao dado foi amarga. Especialistas começaram a revisar suas previsões da Selic para cima – o Credit Suisse acredita que a taxa de juros deve chegar a 8,25% no final do ano; atualmente ela está em 5,25%.

Com a crise energética em curso e o risco de apagões batendo na porta, não há perspectiva de que esse aumento na inflação seja apenas temporário. Afinal, o Banco Central consegue fazer chover dinheiro, mas não água. O mercado já trabalha com a perspectiva de uma inflação persistente.

Nisso, a aversão ao risco dominou e o mercado de títulos públicos bombou. A procura foi tanta que a negociação feita na plataforma do Tesouro Direto teve que ser interrompida devido a alta volatilidade dos preços. Antes da suspensão, o juro com vencimento em 2031 subia a 11,29%, a maior taxa já paga por esse título (que estreou em fevereiro de 2020). Até outro dia, ele estava em 9%, e já era muito.

WEG

A fabricante de equipamentos elétricos foi um dos destaques do dia: alta de 6,44% (vale notar que WEGE3 operava no positivo mesmo quando o Ibovespa amargava no vermelho.

Os papéis da empresa receberam o selinho de Outperform (acima do desempenho médio do mercado) pelo Credit Suisse, que também elevou o preço alvo da ação para R$ 46 (hoje, fechou em R$ 38,84).

O banco acredita que a multinacional de Jaraguá do Sul (SC) está em uma ótima posição para se beneficiar preocupação ambiental crescente pelo mundo – já que atua em energia solar, eólica e, claro, motores elétricos. O Credit também destacou que a companhia, por ter atuação global, é pouco exposta ao "risco Brasil".

Risco que hoje diminuiu um pouco graças a um sopro de civilidade – algo sempre bem vindo, venha de onde vier.

Maiores altas

Petrorio (PRIO3): 8,32%

WEG (WEGE3): 6,44%

Eletrobras ON (ELET3): 6,07%

Inter (BIDI11): 5,81% 

Pão de Açúcar (PCAR3): 5,71% 

Maiores baixas

Suzano (SUZB3): -054%

Bradespar (BRAP4): -0,38%

Vale (VALE3): -0,36%

Ibovespa: +1,72%, aos 115.360 pontos

Em Nova York

S&P 500: -0,46%, aos 4.493 pontos 

Nasdaq: -0,25%, aos 15.248 pontos

Dow Jones: -0,43%, aos 34.879 pontos

Dólar: -1,86%, a R$ 5,2273

Petróleo

Brent: -1,58%, a US$ 71,4

WTI: -1,67%, a US$ 68,14

Minério de ferro: queda de 1,46%, cotado a US$ 130,26 por tonelada no porto de Qingdao (China)



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